Fisioterapia e honorários: limites regulatórios

O Conselho Federal de Fisioterapia surgiu com a incumbência de fiscalizar o exercício da respectiva profissão no nosso país e, no desempenho de sua função normativa prevista no artigo 5-II da Lei 6316/75, adotou o referencial nacional de honorários fisioterapêuticos como padrão mínimo remuneratório-deontológico para o exercício profissional, movimento iniciado no ano de 2009 através da Resolução COFFITO 367, no qual a expectativa era que os Conselhos Regionais de Fisioterapia adotassem medidas fiscalizatórias de caráter educativo, preventivo e punitivo, a fim de se fazer cumprir os objetivos institucionais da referida regulamentação.
Embora o inciso XVI do art. 22 da Constituição Federal seja claro ao dispor que compete privativamente à União legislar sobre organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões, a fixação de preços mínimos era uma praxe de Conselhos Profissionais, mas, em 2010, o Conselho de Administrativo de Defesa Econômica (CADE) iniciou a apuração pioneira por influência à conduta uniforme no mercado de prestação de serviços, o da advocacia, em combate à utilização de processos disciplinares como ferramenta coercitiva para adesão compulsória aos honorários tabelados, prática anticompetitiva disfarçada de normatização ético-profissional.
Primeiramente, quando Conselhos de Classe estabeleceram parâmetros remuneratórios para seus profissionais violaram o princípio da reserva legal, caso essa regulação não tenha sido instituída por meio de lei em sentido formal, porque a atuação do Estado está restrita àquilo que é permitido por lei, de acordo com os meios e formas que por ela estabelecidos e segundo os interesses públicos, conforme disposto no art. 5-II da nossa Constituição Federal. Em segundo lugar, mas não menos importante, a ordem econômica é fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, a fim de assegurar a todos uma existência digna, conforme os ditames da justiça social, que observa, em particular, o princípio da livre concorrência. Por conta disto, não há como admitir um tabelamento imposto como regra a todos os profissionais, sem comprometer o livre exercício da profissão, garantido constitucionalmente, de acordo com o disposto no inciso XIII do art. 5.
Mesmo com histórico desfavorável à utilização da disciplina profissional, com ameaça de aplicação de penalidade pela não observância dos valores mínimos previstos em resoluções, uma vez que a referida normatização extrapola as competências dessas autarquias de fiscalização profissional ao impor limites à autonomia individual e à liberdade profissional, diferentes Conselhos de Classe insistiram no estabelecimento de preços tabelados, dentre eles os de odontologia, corretagem e, também, o de fisioterapia.
Em 2013, o art. 39 da Resolução COFFITO 424/13 incluiu como proibição ética ao fisioterapeuta prestar assistência profissional por valor inferior ao referencial nacional de procedimentos fisioterapêuticos, consequentemente, caracterizando a conduta como infração disciplinar a partir do que dispõe o art. 16-I da Lei 6316/75, sujeitando-o, então, o(a) infrator(a) a processo administrativo para aplicação de penalidade disciplinar, nos termos do art. 17 da norma em questão. Obviamente, isso não poderia prosperar por muito tempo pelos motivos já expostos, quando, em 2021, o CADE agiu contra a regulação de honorários promovida pelo Conselho Federal de Fisioterapia através do processo administrativo nº 08700.003473/2021-16, o que resultou na invalidação do arcabouço normativo que autorizava o uso do aparato estatal com abuso do poder regulamentar e desvio de finalidade para atender interesse classista.
Ao se atribuir preços a procedimentos diferente dos estipulados em resolução de Conselho Profissional, não há violação de princípio ético-profissional, porque a lei não autoriza tais autarquias a estabelecerem, de forma genérica, abstrata e indistinta, quais são os valores mínimos a serem cobrados em procedimentos e serviços prestados pelos profissionais que fiscalizam, visto que, sob tal enfoque, a matéria não tem, a rigor, qualquer relação com a ética, o que afasta, consequentemente, a capacidade processual para qualquer demanda nesse sentido, isto é, esse tipo de norma não prosperar na qualidade de imposição, restando-lhe apenas o status de simples referencial.
Esta é uma produção literária independente, desvinculada da função que o autor desempenha no serviço público e do entendimento da respectiva Entidade sobre a matéria.
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