Pilates: Educação Física ou Fisioterapia?

Em Janeiro de 2019, o Conselho Regional de Educação Física do RJ publicou uma Resolução acerca exclusividade da aplicação do referido método. Como é sabido, atualmente é um nicho de mercado com bastante demanda, logo, concorrido pelos profissionais nele capacitados a trabalhar. Mas quem são eles? Essa é uma boa pergunta para qual cabe os esclarecimentos a seguir.

Pilates não é uma profissão, apesar de muitos entenderem que sim, o art. 5-XIII da Constituição Federal Brasileira de 1988 dispõe que é livre o exercício de qualquer trabalho, atendida às qualificações que a lei estabelecer. Nesse caso, como não há uma, inexiste qualificação legalmente requerida, logo, ao judiciário coube solucionar eventuais controvérsias a respeito, conforme a analogia, os costumes, os princípios gerais do direito e o previsto no art. 4 do DL 4657/42, em especial devido ao uso do método por bailarinos e terapeutas ocupacionais

Por analogia, isto é, a aplicação dos princípios extraídos das normas existentes a situações por ela não expressamente contempladas, no caso a Lei 9696/98 e o DL 938/69,  se alguém que não tenha pelo menos uma das duas formações acadêmicas em questão o aplicar em terceiros como "condicionamento físico" ou "meio de tratamento", respectivamente, exercerá irregularmente a Educação Física ou a Fisioterapia, porque são essas as únicas razões pelas quais tal atividade pode ser proposta, portanto, na qualidade de ato privativo destas profissões regulamentadas, conforme entendimento vigente no processo nº 5022815-89.2017.4.04.7200 do TRF-4.
Resolução de Conselho de Classe obriga somente quem nele estiver inscrito.
Em outras palavras, será inválido qualquer processo administrativo instaurado para submeter fisioterapeuta à legislação que regulamente o exercício da Educação Física ou o contrário. Provavelmente, por isso, o CREF-1 estabeleceu através de ato normativo o Pilates como campo de intervenção exclusivo do educador físico em ambientes destinados a prescrição de exercícios físicos, o que cria obrigações apenas para as pessoas a ele filiadas, conforme já destacado aqui. O problema é que há muitos fisioterapeutas em academias trabalhando com o referido método. 
Mas o que pode estar errado nisso? Analisemos...
Para constituir uma empresa, é necessário apresentar aos Órgãos competentes o contrato social, documento que explicita para qual FINALIDADE ela foi criada. Então, as respectivas burocracias são desenroladas, especialmente a inscrição no CNPJ, o alvará de localização e o registro no Conselho de Classe, quando da oferta de serviços de profissões regulamentadas. No caso da academia, é natural que não fora pensado que tal ambiente viesse a ser compartilhado por diferentes profissionais, logo, se seu objeto social contemplar apenas a prática de exercícios para educação física, ESTARIA "desautorizada" a servir ao público além daquilo que formalmente se propôs, por exemplo, disponibilizando Fisioterapia em seu quadro de atividades. 

O objetivo dessa separação está voltado à arrecadação do governo, porque aquele que eximir-se, total ou parcialmente, do pagamento de tributos, taxas e quaisquer adicionais devidos por lei, incorrerá em crime do sonegação fiscal. Contudo, a Lei Complementar 123/06, que versa sobre os regimes de tributação no Simples Nacional, estabelece alíquotas específicas de acordo com o tipo de serviço prestado: sobre a Educação Física incide de uma e na Fisioterapia, de outra, respectivamente, anexo III e IV, sendo que as aplicáveis à segunda são menores que à primeira até a 4ª faixa, de empresas com receita bruta em 12 meses entre 720 mil a 1,8 milhões. 


Então, podemos depreender que se a empresa faturar Fisioterapia como Educação Física ela pagará mais imposto do que o devido, logo, a parte mais interessada em regularizar esta situação deveria ser o CONTRIBUINTE e não o governo. Contudo, o exercício da atividade empresarial para além dos limites estabelecidos em seu objeto social possui tipicidade como crime falimentar previsto no art. 176 da Lei 11101/05, mas na prática isso não faz o menor sentido e não encontrei uma jurisprudência sequer que versasse sobre algo tão "administrativo", considerando que o governo em nada perde e o particular não obtém qualquer vantagem com tal ocorrência. 

Como funciona na prática

Se você quer trabalhar na REGULARIDADE, seja:
  • um autônomo estabelecido-alvará de pessoa física, quando o objeto social da academia não possuir a Fisioterapia como finalidade de serviço;
  • uma empresa constituída-CNPJ, sediada no mesmo endereço da academia, mas NÃO na qualidade de prestadora de serviço para ela;
  • um funcionário da academia, se esta possuir a Fisioterapia como parte de seu objeto social.
Mas se você quer TER PROBLEMAS, perpetue as seguintes práticas:
  • acorde com a academia divisão de ganhos sobre os pacientes que atender no espaço dela, sem estar devidamente licenciado pela prefeitura como autônomo estabelecido para tanto;
  • seja a pessoa jurídica contratada pela academia para "prestar serviços" para clientes dela, sem que a mesma possua a Fisioterapia como parte de seu objeto social;
  • seja funcionário, formalizado ou não, da academia para exercer a Fisioterapia, sem que a mesma possua tal atividade como parte de seu objeto social.
Se a academia quiser ampliar o campo de atuação dela, abrangendo Fisioterapia e Nutrição, por exemplo, basta promover uma alteração do contrato social, no objeto da empresa-CNPJ, adicionando tais ramos como finalidade do negócio para absorver os respectivos profissionais, independente da forma contratual, e oferecer esses serviços sob sua titularidade. Lembrando que NÃO É necessário o registro de empresa em mais de 01 Conselho de Classe para empresas multidisciplinares, assunto já abordado em outro artigo

Considerações finais

Mais uma vez tivemos outra discussão inócua sobre regulação profissional, a partir de uma infundada polêmica criada pela falta de informação do público e pelo jogo político na luta por reservas de mercado, inapropriadamente realizada através do Poder Público. Como se não fosse suficiente a resolução do conflito sobre a competência de quem pode aplicar o Pilates pelo TRF-4, no Rio de Janeiro a questão foi novamente discutida para ratificar aquilo que já era sabido, nos termos a seguir, que o método não é exclusivo da Educação Física.  


Esta é uma produção literária independente, desvinculada da função que o autor desempenha no serviço público e do entendimento da respectiva Entidade sobre a matéria.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Modelos de ficha de avaliação em Fisioterapia

Diagnóstico fisioterapêutico

Planejamento terapêutico

A mudança precisa partir de você: hoje um leitor, amanhã, um líder!
Alimente sempre a dúvida, porque quem não as tem é incapaz de aprender e evoluir.